terça-feira, 17 de junho de 2014

Qatar tenta construir reputação diplomática

Por ROD NORDLAND e MARK MAZZETTI
DOHA, Qatar - Assim que chegaram, os cinco militantes do Taleban foram levados por uma frota de carros até o acostamento de uma rodovia nos arredores da capital. Ali, longe do olhar do público e sob o olhar atento da segurança qatariana, trocaram abraços com uma delegação que os recebeu. Então foram novamente levados, agora para um local desconhecido.
Se o Qatar cumprir o que promete, esses homens -libertados da prisão de Guantánamo em troca da soltura do sargento americano Bowe Bergdahl, mantido como refém no Afeganistão,- não vão voltar ao campo de batalha nem serão recrutados pelo Taleban como poderosa ferramenta de propaganda, pelo menos não por um ano.
Os trunfos em jogo são altos para o presidente Obama, fortemente criticado por ter, segundo alguns, pago um preço alto demais pela libertação de Bergdahl. No passado, alguns prisioneiros libertados de Guantánamo voltaram a combater.
Mas, nesse caso, o Qatar também tem muito em jogo, já que apostou sua reputação, já enfraquecida, em sua capacidade de manter os homens sob controle e longe das vistas de todos.
"Confiamos que o Qatar terá a capacidade de implementar as exigências e a vontade para tal", declarou um funcionário da administração Obama.
Antes da chegada dos presos, em 1° de junho, o Qatar prometeu que os talebans libertados não farão discursos, não darão entrevistas individuais ou coletivas e não sairão em público. Se telefonarem ao Afeganistão, prometeram os qatarianos, será para suas famílias, não para seus companheiros de armas. Eles estão proibidos de fazer qualquer agitação ou de sair desse país minúsculo no golfo Pérsico pelo prazo de um ano.
O Qatar, que há muito tempo aspira ter importância na diplomacia global, viu sua influência regional se enfraquecer na medida em que seus aliados no Egito, na Tunísia, na Síria e na Líbia perderam poder e força.
O país saiu-se mal, há um ano, quando um esforço para abrir uma representação do Taleban não rendeu discussões de paz com os EUA, como o Qatar esperava. Os representantes do Taleban no Qatar hastearam uma bandeira e começaram a agir como uma embaixada no exílio. O presidente afegão, Hamid Karzai, ficou furioso.
Os qatarianos estão determinados a garantir que nada dê errado desta vez. O xeque Tamim bin Hamad Al-Thani chegou ao poder em junho passado, após a abdicação inesperada de seu pai, o xeque Hamad bin Khalifa Al-Thani, imediatamente após as reações de ultraje pela abertura da representação do Taleban. Ele vem tentando conduzir a política externa do país para mais ênfase na mediação e menos na intervenção direta.
O Qatar controla a emissora Al Jazeera, e muitos de seus vizinhos reagem mal à cobertura crítica feita pelo canal de notícias. A política do Qatar de fornecer armas à oposição na Síria mostrou-se preocupante quando a guerra no país pareceu ter chegado a um impasse e facções extremistas jihadistas se destacaram entre os rebeldes sírios.
Em março, a Arábia Saudita, o Bahrein e os Emirados Árabes Unidos, três dos seis membros do Conselho de Cooperação do Golfo, tomaram a medida incomum de chamar de volta seus embaixadores no Qatar para protestar contra o apoio do Qatar à Irmandade Muçulmana, cujos ativistas tinham sido bem recebidos no país depois de fugirem do Egito.
"Estão tentando voltar a ser o Qatar de 2007, os bonzinhos, amigos de todo o mundo", disse Michael Stephens, do Royal United Services Institute, centro de pesquisas britânico. "Neste momento, o Qatar está tentando apenas avançar o quanto pode de uma maneira que seja inofensiva."NYT, 17.06.2014